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I'sis Almeida

Sócia-fundadora, diretora executiva, de jornalismo e projetos do Portal, I'sis é jornalista e bacharel interdisciplinar em artes formada pela Universidade Federal da Bahia, além de técnica em comunicação visual e pós graduanda em Direitos, Desigualdades e Governança Climática. É criadora e podcaster do Se Organiza, Bonita!

“Bebida batizada”

Entenda os casos de intoxicação por metanol que se espalharam no Brasil

Publicado em 23/10/25 às 13:18

Foto: Markus Spiske/Pexels

Apesar da desaceleração no número de casos, as intoxicações por metanol continuam sendo registradas em diversas regiões do país, especialmente no estado de São Paulo. O Ministério da Saúde confirmou, nesta quarta-feira (22), mais uma morte no estado após o consumo de bebida alcoólica contaminada. Com isso, o total de vítimas em São Paulo subiu para sete, e, em todo o Brasil, chega a dez.

Para compreender melhor os riscos e os efeitos dessa substância, o Portal Black Mídia conversou com dois especialistas da área química.

O que é o metanol

O metanol, ou álcool metílico, é um líquido inflamável pertencente à família dos álcoois. Muito utilizado na indústria, serve como solvente, componente de combustíveis e matéria-prima na produção de plásticos, tintas e anticongelantes.

Pedro Magalhães, autor do livro “Bases anticoloniais para o ensino histórico-crítico de química: primeiras incinerações” — obra que propõe fundamentos teóricos para o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nas aulas de química — descreve a utilidade do álcool para o setor industrial:

“É inegável a relevância do metanol para a indústria química, já que, em escala mundial, são produzidas toneladas desse álcool todos os anos. A partir dele, é possível obter diversas outras substâncias químicas, sendo considerado um importante precursor na área.”

Pedro Magalhães – Arquivo Pessoal

Magalhães é licenciado em Química pelo Instituto de Química da UFBA, mestre e doutorando pela Faculdade de Educação da mesma universidade. Atualmente, é professor de Química no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA).

O especialista explica ainda que do metanol derivam produtos como o formol e o ácido acético, utilizado na fabricação do vinagre, o que demonstra sua importância não apenas industrial, mas também cotidiana.

“Além disso, suas aplicações vão além da indústria química, podendo ser usado como anticongelante, solvente para tintas e resinas, entre outras finalidades”, diz o estudioso. “No entanto, devido à sua ampla produção e alta toxicidade, é fundamental que seu manuseio na indústria seja feito com extremo cuidado, pois trata-se de uma substância extremamente perigosa para o organismo humano”, completa.

Victor Lira – Arquivo Pessoal

Victor Lira, também professor de Química e mestre em Química Aplicada pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), alerta para os danos que o metanol pode provocar no organismo humano. “Ao consumir o metanol, o organismo apresenta inicialmente sintomas semelhantes aos causados pelo álcool comum, como euforia, tontura e perda de coordenação motora.”

Segundo dados da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), estima-se que, desde 1998, cerca de 40 mil pessoas em todo o mundo tenham sido afetadas por intoxicação por metanol, resultando em aproximadamente 14,4 mil mortes. A entidade alerta que milhares de casos continuam ocorrendo todos os anos e que, quando o tratamento não é realizado de forma rápida, as taxas de mortalidade variam entre 20% e 40%, dependendo da concentração da substância e da quantidade ingerida.

Para Lira, o problema mais grave ocorre quando o corpo tenta eliminar essa substância. Durante esse processo, o metanol é transformado em compostos ainda mais tóxicos.

“No fígado, por meio da enzima chamada álcool desidrogenase, a mesma que atua na metabolização do etanol, o metanol é convertido em formaldeído, uma substância já bastante nociva. Em seguida, o formaldeído se transforma em ácido fórmico, que é ainda mais perigoso.”

O grande risco, segundo o professor, está no fato de o organismo eliminar o ácido fórmico muito lentamente, o que faz com que ele se acumule no corpo.

“Esse acúmulo provoca acidose metabólica, ou seja, torna o sangue mais ácido, gerando diversos danos, como lesões nos nervos ópticos que podem causar cegueira, além de comprometer o sistema nervoso central.”

Quais as recomendações?

“O que a sociedade civil pode fazer é cobrar por um controle de qualidade efetivo das grandes empresas e, por enquanto, evitar 100% o consumo de destilados, pois os consumidores e consumidoras não têm condições de identificar a contaminação por metanol a olho nu.”

Pedro Magalhães destaca que a presença de metanol é comum em destilados e, por isso, a sociedade civil deve exigir um controle de qualidade mais rigoroso por parte das grandes empresas.

Victor Lira reforça que não é possível identificar o metanol visualmente.

“O que você pode tentar é identificar as violações da embalagem, exemplo: volume da bebida que pode estar acima do comum, rótulo diferente, tampa que não está bem colocada, coisas do engarrafamento que os falsificadores não conseguem deixar 100% igual ao original.”

A orientação do especialista é que, neste momento em que o país tenta identificar a origem das intoxicações, se evite consumir drinks em bares e, principalmente, bebidas destiladas. “Por cheiro, cor, sabor, não dá para saber se a bebida está contaminada ou não”, diz.

Além disso, ambos os especialistas ressaltam que, se os sintomas de ressaca estiverem mais intensos do que o habitual, é essencial procurar imediatamente uma unidade de saúde para receber o tratamento adequado.

ALERTA

De acordo com o Ministério da Saúde, os principais indícios de intoxicação por metanol incluem visão embaçada, desconforto estomacal e quadros semelhantes à gastrite. Diante do surgimento desses sintomas, é fundamental procurar imediatamente uma unidade de saúde, pois a exposição ao metanol pode provocar cegueira irreversível e até morte se o atendimento não for rápido.

Entre os sintomas mais comuns estão visão turva ou perda total da visão, mal-estar generalizado, náuseas, vômitos, dor abdominal e sudorese intensa.

Caso esses sinais sejam percebidos, é indispensável buscar atendimento médico de urgência e, se possível, entrar em contato com uma das centrais de orientação abaixo:

Disque-Intoxicação da Anvisa: 0800 722 6001

CIATox da sua cidade, para obter orientação especializada (confira a lista completa no site da Anvisa)

Centro de Controle de Intoxicações de São Paulo (CCI): (11) 5012-5311 ou, de qualquer região do país, 0800 771 3733

Também é importante avisar outras pessoas que tenham consumido a mesma bebida suspeita, orientando-as a procurar avaliação médica o quanto antes.

A demora no diagnóstico e no início do tratamento aumenta significativamente o risco de complicações graves e de morte.

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