Produção com elenco negro e filmagens no Recôncavo reconta a história de Sikán, princesa que desafia o destino imposto pelos homens.
Publicado em 13/08/25 às 19:23
Foto: Reprodução
O silêncio das águas do rio Paraguaçu e as fachadas coloniais de Cachoeira e São Félix vão se transformar em cenário de um épico contemporâneo. Em outubro, a cineasta cachoeirana Everlane Moraes inicia as filmagens de O Segredo de Sikán, seu primeiro longa-metragem de ficção, um projeto que une mitologia africana, realismo fantástico e questões urgentes como o protagonismo feminino e as disputas territoriais.
A narrativa parte de um mito difundido pela sociedade secreta masculina Abakuá, de Cuba, que chegou até Everlane durante sua formação em cinema na Escuela Internacional de Cine y TV (EICTV), entre 2015 e 2018. No relato original, Sikán, princesa da Nigéria antiga, é escolhida para guardar um segredo capaz de trazer a paz ou a guerra ao mundo. Acusada de revelá-lo, é julgada e morta por homens.
Everlane, porém, subverte a história: em sua versão, Sikán não quebra sua promessa. Para escapar da condenação, ela se atira ao rio Odan, transformando-se em um peixe mágico que atravessa séculos até alcançar o rio Paraguaçu, na Bahia, onde luta pelo retorno do sol e pela justiça para o seu povo.
Essa mudança de perspectiva, segundo a diretora, é um gesto político. “Os mitos são histórias geralmente contadas por homens em diferentes épocas e contextos históricos. Nesse em específico, Sikán foi morta por ser uma mulher frágil e passiva, assim como muitas outras personagens femininas de outras tantas narrativas já conhecidas. Resolvi então mudar o caráter da personagem, de indiscreta e indefesa, para discreta e corajosa”, afirma.
O contato com o mito foi aprofundado pelo diálogo com a obra da artista cubana Belkis Ayón (1967-1999), que visualizou a história em gravuras e colagens, e cuja influência será homenageada no filme por meio da personagem Sara. Em 2023, o projeto levou Everlane à Nigéria, onde visitou a Floresta Sagrada de Osun-Osogbo, Patrimônio Mundial da UNESCO, e apresentou a proposta ao mercado de Nollywood (segunda maior indústria cinematográfica do mundo) em busca de parcerias e de uma janela de exibição para o público africano.
O projeto acumula prêmios e passagens por laboratórios nacionais e internacionais, entre eles o título de Melhor Projeto em Desenvolvimento no BrasilCineMundi, em Belo Horizonte, e no holandês Hubert Bals Fund. A produção é assinada pela Carapiá Filmes e Pàttàki Produções, com distribuição da Embaúba Filmes — a mesma de Marte Um, indicado pelo Brasil ao Oscar em 2023 — e apoio da Odé Produções. O financiamento vem do Fundo Setorial do Audiovisual, da Lei Paulo Gustavo e de editais estaduais da Bahia.
As filmagens, majoritariamente noturnas, serão ambientadas nas cidades-irmãs de Cachoeira e São Félix, separadas e unidas pelo Paraguaçu. O elenco, composto exclusivamente por atores e atrizes negros, incluirá talentos locais e nomes consagrados do cinema brasileiro, entre eles, em negociação, a atriz Grace Passô, primeira dramaturga negra a conquistar o Prêmio Shell de Teatro.
Para a produtora Fernanda Vidigal, a obra busca equilíbrio. “A intenção sempre foi de viabilizar uma produção que pudesse respeitar a assinatura artística da Everlane, mas que também se comunicasse com o nosso público.”
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