Operação é considerada a maior em 15 anos e reacende debate sobre segurança pública no Rio
Publicado em 29/10/2025 às 21:33

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
O Rio de Janeiro voltou ao centro do debate nacional sobre segurança pública e direitos humanos após a deflagração da Operação Contenção, uma megaoperação policial que, segundo dados oficiais, deixou ao menos 121 mortos nos complexos da Penha e do Alemão, na Zona Norte da capital.
A ação, considerada a maior em 15 anos e a mais letal da história fluminense, reacendeu discussões sobre o uso da força policial, a militarização das favelas e a persistência da violência letal nas periferias.
Deflagrada no fim de outubro de 2025, a operação mobilizou cerca de 2,5 mil agentes civis e militares, com o objetivo declarado de capturar lideranças do Comando Vermelho (CV) e conter a expansão territorial da facção, que, segundo estudos do Instituto Fogo Cruzado e da Universidade Federal Fluminense (UFF), havia ampliado seu domínio no Grande Rio em mais de 8% entre 2022 e 2023.
A ofensiva, planejada durante mais de um ano, foi classificada pelo governo estadual como um “duro golpe contra o narcoterrorismo”. No entanto, os desdobramentos expuseram um cenário de caos e horror no estado.
A escalada da violência
Logo nas primeiras horas de ontem, dia 28 de outubro, moradores dos complexos da Penha e do Alemão relataram intensos tiroteios, explosões e bloqueios em vias de acesso. Escolas suspenderam aulas, linhas de ônibus foram desviadas e a cidade entrou em estágio de atenção. À medida que as horas avançavam, surgiam nas redes sociais imagens e vídeos mostrando corpos espalhados nas ruas e em áreas de mata.
Testemunhas escutadas pela Agência Brasil relataram execuções sumárias, torturas e decapitações. Moradores afirmam que, durante a madrugada, agentes do Batalhão de Operações Especiais (Bope) formaram um “muro humano” para impedir a fuga de suspeitos pela mata da Serra da Misericórdia, concentrando ali o confronto mais intenso. Segundo os relatos, dezenas de corpos foram encontrados na região conhecida como Mata da Pedreira.
A Associação Comunitária do Parque Proletário da Penha confirmou o resgate de cerca de 80 corpos apenas naquela área. Fotografias e vídeos feitos por jornalistas e moradores mostravam uma cena de guerra: corpos empilhados na Praça São Lucas, cobertos por lençóis, enquanto familiares tentavam fazer o reconhecimento das vítimas.
O discurso oficial e as denúncias
O governador Cláudio Castro, em entrevista coletiva, declarou que a operação foi “um sucesso” e que “o Estado retomou o controle de territórios dominados pelo crime”. 
“Temos muita tranquilidade de defender o que foi feito ontem. Queria me solidarizar com as famílias dos quatro guerreiros que deram a vida para libertar a população. Eles foram as verdadeiras quatro vítimas. De vítima ontem, só tivemos os policiais”, afirmou Castro no Palácio Guanabara, sede do Executivo estadual. Segundo ele, “quem exerce o poder é o Estado, e não o tráfico”. 
No entanto, organizações civis, entidades de direitos humanos e moradores contestaram a versão oficial. A diretora da Anistia Internacional no Brasil, Jurema Werneck, classificou a operação como “desastrosa”.
“É preciso dizer que essa operação não é um sucesso. É desastrosa. Qualquer pessoa sabe que assassinato e sucesso não entram na mesma frase. Assassinato de centena de pessoas. Nós recebemos notícias de milhares de pessoas traumatizadas e que estão sofrendo”, afirmou.
A Fiocruz, ao lado de mais de 40 instituições e movimentos sociais, divulgou o manifesto “Por uma Segurança Pública Cidadã”, no qual denuncia a “necropolítica” praticada nas favelas e exige responsabilização das autoridades. O documento destaca que operações como a Contenção violam decisões do Supremo Tribunal Federal, como a ADPF das Favelas, que restringe ações policiais em comunidades durante períodos de risco à vida e sem justificativa técnica detalhada.
ONU pede investigação sobre a operação no Rio
A repercussão internacional da Operação Contenção ganhou força após o pronunciamento do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, que se posicionou frente o número de mortos durante as ações policiais nos complexos da Penha e do Alemão.
Em comunicado oficial divulgado nesta quarta-feira (29), o porta-voz da ONU, Stéphane Dujarric, afirmou que Guterres pediu uma investigação imediata e o cumprimento rigoroso das normas internacionais de direitos humanos por parte das autoridades brasileiras.
“Posso afirmar que o secretário-geral está profundamente preocupado com o grande número de vítimas durante a operação policial realizada ontem nas favelas do Rio de Janeiro”, afirmou.
Impactos sociais e humanitários
O saldo humano da Operação Contenção é de 121 mortos, entre eles quatro policiais, dezenas de feridos e centenas de famílias deslocadas ou traumatizadas. Comunidades inteiras ficaram sem acesso a serviços básicos, como escolas, postos de saúde e transporte público pararam de funcionar. Moradores relatam medo, insônia e a repetição de um padrão de violência.
A Anistia Internacional e entidades locais prometem acompanhar juridicamente os casos e prestar apoio psicológico às vítimas e familiares. O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro instaurou inquéritos para apurar as denúncias de execuções e tortura, mas, até o momento, não há indiciamentos formais. Em meio ao cenário de dor e desconfiança, as mães das vítimas se mobilizam em busca de justiça.
Operação divide opiniões no Congresso
Deputados de diferentes viés ideológicos se manifestaram nesta quarta-feira (29) sobre a ação. Enquanto parlamentares de esquerda classificaram o episódio como uma “chacina” e exigiram mudanças urgentes na política de segurança do estado, representantes de partidos de direita defenderam a atuação das forças policiais como necessária ao enfrentamento do crime organizado.
Durante coletiva na Câmara dos Deputados, membros das federações Psol-Rede e PT-PCdoB-PV criticaram duramente o governo do Rio de Janeiro, acusando o governador Cláudio Castro de promover uma política de extermínio em favelas. O deputado Reimont (PT-RJ), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, afirmou que a operação pode ter deixado mais de 200 mortos, chamando-a de “a maior chacina do Brasil, superando a do Carandiru”.
A líder do Psol, Talíria Petrone (Psol-RJ), destacou o que considera uma falta de planejamento e de políticas estruturais no combate ao crime.
“O que tem sido feito para enfrentar as organizações criminosas é um banho de sangue. Há décadas a gente enxuga sangue, e as famílias continuam sendo destruídas por um modelo de segurança pública encampado pelo governador Cláudio Castro, que é incompetente e covarde”, afirmou.
Outros parlamentares, como Lindbergh Farias (PT-RJ) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ), defenderam uma mudança de paradigma na atuação do Estado.
Em contrapartida, parlamentares de direita defenderam a ação policial. O deputado Rodrigo Valadares (União-SE) afirmou que a operação foi necessária para conter a violência e garantir a segurança da população. “Esses criminosos não respeitam a lei, nem a vida. A polícia do Rio fez o que precisava ser feito”, disse. Na mesma linha, o deputado Delegado Caveira (PL-PA) declarou que não se trata de uma chacina, mas de “legítima defesa da sociedade”.
*Com informações da Agência Brasil
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