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I'sis Almeida

Sócia-fundadora, diretora executiva, de jornalismo e projetos do Portal, I'sis é jornalista e bacharel interdisciplinar em artes formada pela Universidade Federal da Bahia, além de técnica em comunicação visual e pós graduanda em Direitos, Desigualdades e Governança Climática. É criadora e podcaster do Se Organiza, Bonita!

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Da Redação

O Portal Black Mídia (antigo Portal Black Fem) é uma midtech de jornalismo e design de soluções cuja produção de notícias e conteúdo é realizada celebrar a juventude negra entre 15 e 35 anos, e unir comunidades. A startup se compromete a fornecer conteúdo significativo, relevante e inspirador que promova a representatividade, a igualdade e o progresso da comunidade negra, especialmente da geração Z.

De que Geração Z estamos falando?

Gen Z negra questiona modelos tradicionais de trabalho e propõe novas formas de viver a carreira

Publicado 15/05/2025 às 12h41

Fotos da colagem: Cilene Ribeiro e Joyce Xavier (centro); Canva (laterais)

Enquanto CEOs e empresários rotulam a Geração Z como uma geração “Nutella” e avessa ao trabalho, jovens dessa geração revelam outra perspectiva sobre si mesmos: insatisfeitos com os modelos de trabalho que herdaram, querem mais propósito, bem-estar e humanidade no ambiente profissional. 

Vira e mexe, algum gestor publica em sua conta do LinkedIn que entrevistou um jovem e este não aceitou bem o salário ofertado, mesmo com os “benefícios” oferecidos pela empresa como 13º salário, FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), vale-transporte (VT), vale-alimentação e adicional noturno.

Embora haja variações nas fontes sobre o período de nascimento da Gen Z, ela é composta majoritariamente por pessoas nascidas entre 1995 e 2010. Outros estudos também apontam o intervalo de 1997 a 2012.

Em termos de trabalho, as diferenças raciais dentro da geração mostram que, muitas vezes, nem todos estão falando da mesma Geração Z, descartando fatores como raça, classe, gênero e outros marcadores que podem influenciar diretamente o aspecto profissional dessa geração.

Como verdadeiros nativos digitais, os Gen Z cresceram habituados a acessar informações rapidamente, navegar entre múltiplas plataformas e se comunicar de forma ágil e direta. Valorizam autenticidade, diversidade e propósito, buscando se conectar com marcas, instituições e pessoas que demonstrem um compromisso real com causas sociais e ambientais.

São diferentes dos Millennials (nascidos entre cerca de 1981 e 1996). No trabalho, os Millennials valorizam propósito, flexibilidade e reconhecimento, enquanto a Gen Z prioriza saúde mental, autenticidade, diversidade e, muitas vezes, não hesita em rejeitar ambientes tóxicos ou desalinhados com seus valores.

Os Millennials cresceram em um contexto econômico relativamente mais estável, mas enfrentaram crises como a de 2008 ao entrarem no mercado. Já a Gen Z enfrenta um mundo marcado por múltiplas crises – climática, econômica, sanitária, o que os torna mais pragmáticos, adaptáveis e questionadores.

Flávia Silva, estrategista de carreira com mais de 15 anos de experiência em desenvolvimento humano, diversidade e inclusão, além de especialista em recolocação profissional, afirma que a Geração Z é disruptiva e questionadora, com uma perspectiva diferente sobre carreira, menos focada na estabilidade e mais em visibilidade e ganho financeiro.

“O que acontece é que estamos vivendo um conflito muito grande de gerações. Já temos, inclusive, uma nova geração: a Alfa, que são os filhos dos Millennials, nascidos a partir de 2010. Sobre a Geração Z, costumo dizer que essa é uma geração disruptiva, que veio realmente para tirar pessoas da minha geração da zona de conforto”, relata a especialista.

Publicações sobre a Gen Z encontradas na plataforma LinkedIn

Gen Z em dados

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a Geração Z representa uma fatia significativa da população mundial, com cerca de 32%, e é considerada uma força importante no mercado de trabalho e consumo. No Brasil, são 47 milhões de pessoas nessa faixa etária, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Destes jovens, 48% são economicamente ativos.

Apesar de o desemprego ser um dos temores da geração, 50% preferem a demissão a permanecer em um lugar de que não gostam. A transparência nas relações é um item bastante requisitado por esses profissionais.

Estima-se que mais de 9,8 milhões de jovens entre 15 e 29 anos (20%) estavam sem trabalho e fora da escola até o segundo semestre de 2024. Para esses jovens, existe até um apelido: “nem-nem” (nem trabalham, nem estudam).

O estudo “Nem-nem ou sem-sem? Jovens querem trabalhar, mas não têm oportunidades no mercado”, divulgado pelo Dieese na edição de setembro de 2024 do Boletim Emprego em Pauta, traz reflexões importantes sobre os jovens chamados de “nem-nem”.

De acordo com a pesquisa, a maioria desses jovens não está parada ou sem fazer nada: muitos estão em busca de emprego, cuidando da casa, de filhos ou de familiares, ou ainda participando de cursos livres e atividades de formação. Apenas cerca de 7% não estão envolvidos em nenhuma dessas ocupações, segundo o levantamento.

Gen Z por ela mesma

Joyce Xavier, 27, designer, nascida no Rio de Janeiro e moradora de Salvador, nasceu em 1997. Ela afirma que pensa no trabalho como um meio para alcançar estabilidade. Suas aspirações profissionais não são necessariamente grandiosas.

“Eu espero apenas me sentir e ser uma profissional completamente capacitada na minha área e ganhar o suficiente para ter uma vida confortável.”

Marleson Moura, 28 anos, estudante nascido em 1996, relata que tem sido difícil pensar em carreira, considerando seu contexto social.

“Se a gente pensa carreira como uma trajetória profissional coesa, é praticamente impossível para pessoas de classe baixa como eu focar nisso. A todo tempo, preciso encontrar outras formas de fazer dinheiro enquanto construo minha carreira. Mas, se pensarmos que uma carreira pode ser enriquecida por esses trabalhos que destoam do que eu almejo, então minha carreira está enriquecida.”

Joyce e Marleson são jovens negros e, consequentemente, vítimas da violência do Estado e da ausência do cumprimento de diversos de seus direitos no Brasil, como mostram os dados. A pesquisa Diversidade Jovem, do Ensino Social Profissionalizante (Espro), mostrou que 41% dos jovens negros no Brasil já foram excluídos de grupos sociais no ambiente de trabalho. Além disso, 38% não tiveram reconhecimento por suas ideias. O estudo foi realizado em parceria com a Diverse Soluções, ecossistema de negócios em diversidade e inclusão.

A influência de fatores como classe social e identidade na forma como a carreira é planejada é um aspecto crucial para esta geração. Uma análise racializada de acordo com a especialista em carreira Flávia Silva, ajuda a entender que, ao se tratar da Gen Z negra, estamos falando de uma geração com especificidades distintas da população não negra.

Silva explica que o mundo do trabalho tem uma relação diferente com pessoas negras, principalmente com mulheres. “A gente não pode esquecer que, do ponto de vista da pirâmide social, nós, mulheres negras, estamos lá em último lugar. Então, essa relação do mercado de trabalho com as mulheres negras é uma relação diferente.”

Jovens negras enfrentam desafios no mercado de trabalho que incluem maior taxa de desemprego, menor renda e maior probabilidade de estarem na informalidade – com uma renda 47% menor que a média nacional e quase três vezes menor do que a de homens brancos.

“Quando essa profissional consegue construir uma boa marca pessoal, ter um posicionamento forte no LinkedIn e nas redes sociais, somente assim ela vai conseguir atrair oportunidades”, ressalta Flávia.

Cilene Ribeiro, 26, atriz, roteirista e produtora de Salvador (BA), vê o conceito de carreira como algo múltiplo.

“Podemos ter mais de uma profissão, especialmente no campo das artes, onde é comum e, na maioria das vezes, necessário atuar em mais de uma função. Sou atriz, roteirista e produtora, e vejo essas profissões como partes integradas da minha trajetória.”

Cilene, assim como milhares de jovens negras no país, vê sua raça como fator determinante em sua vida profissional.

“Ser uma mulher negra de origem periférica me faz ter consciência de que minha trajetória não parte do mesmo ponto que a de outras pessoas. Planejo minha carreira levando em consideração que sou uma pessoa negra, ciente de que isso tem um impacto direto nas barreiras que terei que enfrentar.”

Para driblar o racismo e outras opressões estruturais, Flávia sugere o relacionamento e o networking como fatores essenciais. Ela cita o empreendedorismo não como solução, mas como uma alternativa possível para a juventude negra, muitas vezes excluída ou subjugada no mercado.

“O que é o empreendedorismo enquanto competência? É você criar soluções, é você resolver o problema de alguém. Ofertar soluções que muitas vezes somente o jovem consegue pensar para outras pessoas e empresas pode ser uma opção para quem vê as portas se fecharem por conta de aspectos raciais.”

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